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A representatividade feminina no cinema

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Dezembro de 1895, Cidade de Paris, França. A entrada do Grand Café não estava exatamente movimentada naquela noite específica. Mas isso não desmotivou os irmãos Auguste e Louis Jean Lumière de fazer a grande exibição de estreia. A nova invenção atraiu interessados e curiosos, mudando a forma de observar a arte. E se tornando uma arte, o cinema. Você já deve ter escutado essa história, certo? Mas você já ouviu falar de Alice Guy Blaché? Tendo o primeiro filme, A Fada dos Repolhos, lançado em 1896, foi a primeira produção que combinou a ficção teatral com imagem em movimento. A francesa Alice Guy se tornou a primeira diretora e produtora-executiva da história do cinema, além de ter sido pioneira no uso de efeitos especiais.

Outras figuras femininas, que tiveram grandes papéis na direção e na criação da história do cinema, podem ser citadas como exemplo: Lois Weber, Dorothy Arzner, Frances Marion, Mary Pickford e June Mathis. No entanto, com o auge de Hollywood e a conversão do cinema em uma grande indústria, aumentou também a insistência em colocar as mulheres em segundo plano e ter suas realizações esquecidas.

Hoje, cerca de 121 anos depois, as mulheres continuam enfrentando grandes problemas para conquistar seu espaço no meio cinematográfico. Apesar do crescimento de debates sobre diversidade e igualdade dos gêneros nos últimos anos, uma pesquisa aponta dados nada satisfatórios. De acordo com o Center for the Study of Women in Television and Film, da Universidade do Estado de San Diego, o número de mulheres trabalhando na direção foi de apenas 7%. Tendo uma queda de 2% em comparação à 2015, que tinha 9% de representatividade feminina em Hollywood.

Enquanto isso no Brasil, a representação feminina está crescendo de forma lenta mas significativa. De acordo com relatório divulgado pela Agência Nacional do Cinema (Ancine), apenas 29 dos 143 filmes brasileiros lançados em 2016 foram dirigidos por mulheres. Ou seja, 78,3% das obras cinematográficas foram dirigidas por cineasta do sexo masculino. Entretanto, o percentual de filmes dirigidos por mulheres aumentou 5,6% se comparado ao ano de 2015, quando foi de 14,7%. Sendo o segundo maior percentual registrado na série histórica iniciada em 2009.

A representação feminina por trás das câmeras é de extrema importância para as personagens femininas que aparecem nas telas. Ainda é um desafio assistir um filme e reconhecer uma personagem ou protagonista feminina que não seja estereotipada. Essa é uma das questões preocupantes na sociedade e que, consequentemente, reflete nas produções cinematográficas. Além do número restrito de representatividade, há uma escassez na construção dos argumentos, histórias, motivações e direção que as mulheres possuem dentro de um filme.

Personagens femininas que são retratadas como indefesas, tolas ou inocentes. Que vivem à margem do homem ou que tenham sua história girando apenas em torno dele. Que se tornam a única figura sexualizada do roteiro. A falha quando não há alguém que já vivenciou a opressão e as dificuldades em ser e viver como mulher, se converte em um ponto de vista não detalhado e até mesmo com representações clichês. Ou seja, a representatividade feminina na produção de conteúdo cinematográfico é um passo indispensável para a criação de novas personagens ou protagonistas femininas. Como aponta vários estudos anteriores da San Diego State University, os filmes com homens na direção e/ou no roteiro tem apenas 18% de mulheres como protagonistas. Enquanto isso o índice melhora quando há ao menos uma diretora e/ou roteirista: o número sobe para 57% de mulheres como protagonistas.

Quando é abordado o tema de representatividade feminina no cinema, não é apenas a questão de cumprir necessariamente uma ‘cota’. O problema não será resolvido colocando uma  ou duas personagens femininas no enredo. Nos cinemas ou na televisão, uma personagem sendo forte e sexy ou inocente e indefesa, acaba por ser uma representação da fantasia masculina. A teórica feminista Laura Mulvey aponta que a representação feminina no cinema sofre com a escopofilia. Ou seja, o prazer visual que é produzido ao olhar para o personagem feminina como objeto, resultando em um desejo e, por fim, dando a possibilidade de auto-identificação para o público masculino.

A questão é mostrar a personagem feminina dentro de um contexto em que todo, ou uma parcela, do público feminino possa se identificar. Como as personagens Furiosa, de Charlize Theron em Mad Max, e Rey, de Daisy Riley em Star Wars. Ambas são fortes, independentes, teimosas e capazes de fazer o que precisa ser feito, mas ao mesmo tempo elas não escondem a própria fragilidade. Nenhuma das duas se apresenta em qualquer contexto voltado para o prazer masculino e dão a possibilidade de identificação por inúmeras espectadoras.

Teste de Bechdel

Inspirado em uma história da cartunista norte-americana Alison Bechdel, chamada Dykes to Watch Out For, de 1987. O teste de Bechdel possui o objetivo de avaliar a qualidade da representatividade feminina seja na literatura, no teatro ou no cinema. Para uma produção cultural passar pelo teste, ela precisa responder às seguintes perguntas:

  1. Existem duas ou mais mulheres com nomes?
  2. Elas conversam entre si?
  3. Elas conversam entre si sobre algo que não seja um homem?

Teoricamente essas três perguntas são simples e relativamente fáceis de serem resolvidas em um roteiro, mas a realidade é exatamente oposta. Sem dúvida é muito mais comum encontrar filmes com dois ou mais homens conversando ou interagindo sobre algo que não seja uma mulher. É fato que a vida e as conversas entre mulheres não giram em torno dos homens. Mas ainda assim é raro encontrar diálogos e cenas que reproduzam de forma realista. Até mesmo filmes direcionados para as mulheres podem não passar no teste, exatamente pelo modo que as protagonistas são estereotipadas.

 

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Raissa Lopes

Estudante de Jornalismo, amante de livros e curando o tédio com curiosidade.

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Raissa Lopes

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